VALE A PENA VER DE NOVO.

 19/09/2006
JOSUÉ, O JAPA DA SEICHO NO IE E UMA PUTA DOR DE BARRIGA
 
- Pai nosso que estais no céu...
Meu, eu não acredito! Duas e meia da matina, puta frio desses, mó dor de barriga e o porra do Josué quer rezar! Vou te contar um negócio. O Josué é um puta amigo, mas é cheio das manias. Deve ser a rapa de ácidos que ele tomou nos anos 80”s. Sequelou geral, só pode ser. Agora, então, que entrou pra corrente carismática e freqüenta a igreja do padre marcelo, meu deus! Faz a aeróbica do senhor, é mole?! Meu, que puta dor de barriga. Acho que vou descolar uma moita e dar um cagão aqui mesmo. Acho que tem jornal no carro. Também, sou o mó zoião. Já tinha mandado ver um sarapatel e ainda mandei ver um mocotó... foda! A gente foi ficar de campana logo numa casa do norte. E o porra do japa demorou pra cacete
- Você devia se concentrar na oração! Ó o exemplo dele...
Ah, ainda tenho que me concentrar, sei. Eu quero é me concentrar é numa privada, porra! Eu quero é passar um fax pra Chicago, pra Boston, isso sim! “Olha o exemplo dele” Ah, se liga! É lógico que o cara tá rezando. Até eu. Se eu tivesse ajoelhado, na beira da Billings, algemado, com uma fita crepe na boca e com um cano de uma 357, niquilado - reforçado e com respiro - encostado na minha testa, rezava até em aramaico, porra! Noutros tempos, o Josué sentava o dedo e subia o gás do maluco no ato. Não tinha esse embaço. A gente sai fora e ia tomar uma lá no alemão. Agora não. Quer entregar o corpo. Daqui a pouco a gente faz missa de corpo presente. Bom, pelo menos ele não é adepto de nenhuma religião indú, né?! Já pensou? A gente metendo fogo no peão na beira do rio ouvindo ravi shankar?
- Você precisa encontrar jesus...
Ah, sai dessa, meu! Eu quero é cagar! Quem vai encontrar jesus é o maluco aí. No momento, a única coisa que eu quero encontrar é uma privada. Nossa, parece que tem uma briga de gatos roucos na minha barriga. Caralho, a gente foi pago pra jogar o japa pra trás, mais nada. E tem outra, o que adianta rezar o pai nosso. Vai ver o japa aí é da seicho-no-iê e não vai adiantar porra nenhuma. O cara nem vai pro céu do são pedro. Vai lá pra aquelas paradas do buda... sei lá como é!
- Só vou rezar uma salve rainha e depois a gente vai...
O quê?! Uma salve rainha?! Tá louco. Ah, desse jeito eu vou trampar sozinho. Que bosta! Sabe de uma coisa? Eu vou atravessar o samba! Vou pegar o meu ferro e terminar o trampo agora. Ó aqui ó... PUM! Pronto, o maluco subiu.
- Eu não tinha terminado de rezar, porra! Assim não dá!
- Ô Josué, dá um tempo irmão. O japa não era católico e eu preciso cagar. Josué, meu, dá um tempo cara. Se você continuar assim, xarope, eu vou lá naquela porra de terço bizantino e passo todo mundo. Valeu?

(JCF)

03/03/2006

LET IT BE

 Peguei a minha garrafa, na mochila, e dei um bom gole. Dos grandes. Estava precisando dum trago. O ônibus tava vazio e eu tava sentado lá no fundo. Assim, não corria o risco de algum abelhudo “puxar conversa”. Detesto gente que “puxa conversa”. A Julia gostava de Beatles. Vivia dizendo que tinha nascido na época errada. Enquanto todo mundo tava ligado naquela coisa anos 80’s, tipo Police e Talking Heads, Julia permanecia fiel aos quatro garotos de Liverpool. Era uma de suas paixões. As outras eram poesia, batata frita, gin-tônica e eu. Não necessariamente nesta ordem. Desconfio que eu só perdia pros Beatles. Enquanto lembrava dessas coisas, o ônibus do Expresso Brasileiro, contornava as curvas da serra. Era um segunda feira. Estava nublado, um dia cinza. Do jeito que a Julia gostava. Quando o tempo encobria ela me ligava com a voz mais sexy do mundo. Eu dava um cambau no trampo e ela, na faculdade. Passávamos o dia na cama, transando e assistindo filmes antigos, em preto e branco e comendo pipoca. O ônibus chegou na rodoviária. Antes de descer, dei um ultimo gole. Deixei a garrafa vazia em cima do banco. Peguei um táxi. No caminho, vou lembrando de tudo. Dos verões e das festas que fazíamos de noite, na praia. Peço ao motorista que vá pela praia, quero ver o mar neste dia cinza. Julia era branca. Muito branca e só tomava banho de lua. Nunca de sol. Lembrei das poesias dela. Escrevia muito, sempre, em qualquer lugar. Meu apartamento vivia riscado. Nas paredes, ela escrevia com o lápis de olho. No espelho do banheiro, com baton. Até no nosso lençol tinha poesia, escrita com bic preta. E todos terminavam com um “eu te amo”. O mar estava ressacado. Ondas grande e bravas arrebentavam na areia. Vinte e cinco anos. Eu não via àquela mar à vinte e cinco anos.  Pedi pro motorista parar. Já estava perto. Podia seguir a pé. Tirei o sapato e arregacei as calças. A praia estava deserta e ventava muito. Pisei na areia. Pisei e parei. Era como se os meus pés pisassem o passado. Era como se aquele mar estivesse me esperando. Vinte e cinco anos me esperando. E lá estava eu, de paletó e gravata. Dei um cambau num dia cinza pra ver a Julia. Vou andando pela areia mesmo. E logo vejo o portão. Atravesso a avenida e nem paro na entrada. Era como se tivesse sido ontem. Não vacilo e o caminho vem todo em minha mente. Sigo direto. Na terceira alameda, entro à esquerda. E lá está, ao lado dum salgueiro. Chego perto e vejo sua foto, no túmulo. Seus cabelos louros e a pele branca. Na foto ela sorri. Era Julia. Abro a mochila e tiro o meu disc-man, com as caixas do meu computador. Coloco em cima do túmulo. Pego um cd dos Beatles. E ponho pra tocar Let it be. Abro o seu caderno de poesias e começo a ler com dificuldade, pois minha vista já está turva, molhada. Sento e, mais uma vez, tento entender o porquê.

(JCF)

 14/05/2006

ESCOMBROS NOTÍVAGOS & NÃO REAPROVEITÁVEIS AGORA

Eu dirigia quase à zero por hora. Como a minha vida, como a madrugada. Na avenida deserta e perdida de existência e toda cheia de retas sonhadas na infância. No assoalho do carro, garrafas de vinhos, todos doces, de quinta, batiam uma na outra, revelando o único som familiar. Consumidos na esperança de não perceber o tempo perdido nesta viagem. Absolutamente desnecessária e sofrida. Não tirava o pensamento do treisoitão, descansando solene necessário e esperto embaixo do banco. Cruzava com prédios e galpões abandonados de gentes, de ranços ou emoções. Semáforos apagados e caídos nos cruzamentos que não faziam nenhuma diferença. Nenhum pedestre desavisado se fazia esperar prum atropelamento solitário. Um atropelamento milagroso e redentor. Nenhum respiro, nenhum farol alto. Só carcaças desmanchadas por quadrilhas especializadas em comer restos de almas, rastros de emoção pública. Um rodie movie banal. Sem destino e direção. O que fazer? Talvez um café aberto perto da civilização ou, quem sabe, uma igreja 24 horas entupida de vampiros notívagos e carentes de sangue com poesia sem noção de estética moderna ou concreta. Já sei! Uma cadáver à quatro círios onde pudesse me ajoelhar e lamentar sua vida anônima e inútil, entregando flores em dias ensolarados pra pessoas tão anônimas quanto ele. Estirado ali, sem cravos ou carpideiras chorando em espanhol. Este carro não é meu! Não há gasolina suficiente e os pneus deixam marcas leucêmicas no asfalto. Talvez seja o caso de estacionar e procurar uma farmácia aberta de plantão, e descolar, com um balconista cego e risonho, uma cartela de comprimidos de 500 miligramas, que seja o suficiente pra dormir até a próxima encarnação. Um sono privado. Sem sonhos. Calado.

(JCF)


JOSUÉ, O ESCOLHIDO

- Que porra é essa, Josué?
- O que...?
- Essa fungação toda, meu?! Você tá cheirando de novo?
- Ah, isso? (funga várias vezes rapidamente) É pranayama.
- O quê?!
- Yoga. Estou enviando oxigênio pro meu organismo e relaxando. Você devia tentar. Elimina o estresse do dia à dia. (pausa) Será que a ana maria braga vai demorar muito aí nessa clinica?
- Sei lá. Ela tá aplicando botox...
- Gavião...
- Fala...
- E o loro josé...?
- Que tem ele?
- Quem vai cuidar do bichinho?
- Como é que é?
- A gente não vai subir o gás da ana maria braga? Mandar ela pra casa do caralho?
- O acerto é esse...
- Então.
- Então o que?
- O louro josé não vai ficar órfão?
- Caraio, Josué!! O louro josé é só um boneco!!
- Será...? Hum... Já ouvi essa história...
- Que história?!
- De que ele não existe, que é um boneco...
- Meu, o que você tem na cabeça? Merda?  Ô Josué, de onde você tira essas idéias? Já sei: é naquela porra de curso de teatro, não é?
- Não, não é não...
- É sim. Todo mundo que faz esses cursos de teatro ou vira comunista, ou vira maconheiro ou começa à dar abunda, não é?!
- Eu sempre gostei de um baseadinho... você sabe.
- Acho bom!
- (Longa pausa, encabulado) No outro trampo foi eu quem puxou o gatilho, não foi?
- Foi...
- Nesse aqui, dá pra você apertar a ana maria...?
- Ué, dá... por que? Tá afinando, Josué?
- Não, né meu. Olha só: domingo é dia das mães...
- E daí?
- Porra, não tô afim de matar a mãe do Louro José, né? Deixar o cara órfão bem no dia das mães, meu...? (Longa pausa)  Estou fazendo terapia de vidas passadas. Tô muito grilado...
- Por quê?
- Descobri que na reencarnação passada eu fui um assassino.
- Mesmo...? Puxa... que merda, hem? E podia jurar que você tinha sido a Sininho! (Pausa) E na anterior?
- Na anterior...? (Longa pausa. Pensativo) Assassino...
- Sei... e nas outras?
- (Longa pausa, constrangido) Assassino...
- Como é que pode um troço desses?! Caraca!
- (Pausa, aponta pra clinica de estética) O que ela tá fazendo aí?
- Aplicando botox... embaixo da retina, fazendo preenchimento no córtex e no sistema linfático. (Ouve o pranayama do Josué) Precisa ter paciência, meu. Muita...
- Gavião...
- Fala...
- E o Garibaldo?
- Que Garibaldo, Josué??!!
- Do Vila Sésamo, meu! Ele também era um... boneco?
- Josué, acho que vou pegar a minha 45 dar um pipoco bem no meio dos teus cornos, sabia?
- Pô, Gavião...
- Só pra ver se na próxima encarnação você volta, quem sabe, pelo menos, um... um...
- (Corta, com um sorrizão) Topo Gigio!!!

(JCF)




 06/05/2008


carpideiras poeirentas e rins
acomodados clinicamente lá
no fundo

horas mofadas e hemorragias estancadas assepticamente
com cutelo afiado no esmeril das insônias chinfrins
tudo isso

tudo!

pela mediocridade do fim
que acontece nesse exato momento
neste criado mudo
no eterno escuro esquecido dos ácaros
junto aos rashis, paranóias sem tinta e papeis velhos de bis


(JCF)






Hoje
Os poetas,  tamanduás e monjes
                                empalhados
                       no alto da estante
     Aguardam o inútil entardecer
                                no ocidente
Sabendo que nem tudo na puta da vida
                                       vale à pena

(JCF)

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